TJSP 15/10/2019 / Doc. / 912 / Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III / Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: terça-feira, 15 de outubro de 2019
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III
São Paulo, Ano XIII - Edição 2913
912
SALMAZO DE FREITAS (OAB 171095/SP), OSMAIR SEMENSATO GOMES (OAB 144549/SP), RICARDO FERNANDES PAULA
(OAB 132480/SP), LILIANI BACCI JERÔNIMO (OAB 84387/MG)
Processo 0023243-77.2011.8.26.0554 (554.01.2011.023243) - Procedimento Comum Cível - Duplicata - Sonire Comercio de
Roupas Ltda - Claudina Industria de Calçados - - Fundos de Investimento Em Direitos Creditorios da Industriaexodus I - - R.
Soares Comercial Ltda. - - Paulo Rogerio Soares da Silva - - PRS Silva Calçados - Vistos. Trata-se de petição da exequente
SONIRE COMÉRCIO DE ROUPAS LTDA protocolada nos autos do processo movido em face de CLAUDINA INDÚSTRIA DE
CALÇADOS, em fase de execução, arguindo que houve sucessão empresarial da executada pela empresa R SOARES
COMERCIAL LTDA-ME, postulando, assim, a inclusão da referida empresa no polo passivo para responder pelo débito executado
(fls. 268/273). Citada nos autos, a empresa R SOARES COMERCIAL LTDA-ME, cuja denominação atual é PRS SILVA
CALÇADOS, ofertou manifestação/contestação a fls. 384/419. Preliminarmente, arguiu a tempestividade de sua manifestação/
contestação nos autos e defendeu que houve afronta ao disposto no art. 133 do CPC, havendo necessidade de abertura de
incidente de desconsideração da personalidade jurídica, razão pela qual pugnou pela exclusão de seu nome do polo passivo da
lide. No mais, teceu considerações sobre a estrutura societária de ambas as empresas (CLAUDINA INDÚSTRIA DE CALÇADOS
e PRS SILVA CALÇADOS). Defendeu a ausência dos requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica e
reconhecimento da sucessão empresarial. Pediu, assim, a improcedência da pretensão formulada pelo exequente, quanto à
inclusão da empresa PRS SILVA CALÇADOS no polo passivo para responder pelo débito executado. Foram juntados os
documentos de fls. 420/596. A empresa exequente se manifestou a fls. 610/615. DECIDO Inicialmente considerando-se as
alegações da empresa PRS SILVA CALÇADOS no item “a” da contestação a fls. 386/387, bem como o fato de que o AR,
referente à citação (fls. 379/380), direcionado ao seu sócio Paulo Rogério Soares da Silva, foi recebido e assinado por terceira
pessoa, entendo que a citação efetivamente não se aperfeiçoou, já que o AR não foi assinado pessoalmente pelo sócio. Desse
modo, tendo em vista o disposto no § 1º, do art. 239 do CPC, deve ser considerada como suprida a falta citação da referida
empresa no momento em que a parte compareceu espontaneamente a lide e ofertou sua contestação, razão pela qual não há
que se falar em intempestividade da peça processual ofertada a fls. 384/419, ficando sem efeito a certidão de fls. 381. No mais,
não vislumbro afronta ao disposto no art. 133 e ss. do Código de Processo Civil. Isto porque, a empresa exequente fundamentou
o pedido de inclusão da empresa R SOARES COMERCIAL LTDA-ME, cuja denominação atual é PRS SILVA CALÇADOS, no
polo passivo da lide, na sucessão empresarial, razão pela qual desnecessária a instauração de incidente processual, nos termos
do art. 133 do CPC. Sobreleva notar que este juízo, a fls. 348, diante da alegada sucessão empresarial, por aplicação analógica
da disciplina relativa a desconsideração da personalidade jurídica, determinou a citação da empresa R. SOARES COMERCIAL
LTDA (PRS SILVA CALÇADOS) para se manifestar nos autos, ou seja, sob qualquer ótica que se analise a questão, não seria
mesmo necessária a instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, como alegado na contestação. Por
fim, não se vislumbra qualquer prejuízo à empresa PRS SILVA CALÇADOS, já que a ela foi dado o direito a ampla defesa e
contraditório, com a devida citação e apresentação de contestação nos autos. No mérito, entendo que a pretensão do exequente
a fls. 268/273 deve ser acolhida. Extrai-se dos autos que a empresa executada CLAUDINA INDÚSTRIA DE CALÇADOS foi
condenada a pagar em favor da empresa exequente a quantia de R$ 10.800,00. Iniciada a fase de execução, após várias
tentativas de localização de bens da empresa executada (bacenjud e renajud), não se logrou localizar bens passíveis de
penhora, que pudessem garantir o débito exequendo, sendo informado nos autos que a empresa executada teve sua falência
decretada, a qual, contudo, foi revogada, conforme se infere a fls. 337/338. Nesse contexto, diante da ausência de bens
passíveis de penhora em nome da empresa executada, a empresa exequente postulou que fosse reconhecida a sucessão
empresarial da empresa executada pela empresa R SOARES COMERCIAL LTDA-ME, cuja denominação atual é PRS SILVA
CALÇADOS, sob o fundamento que ambas as empresas tem sede na Comarca de Jaú, atuam no mesmo ramo de atividade
(calçados), além do fato de que o sócio da empresa PRS SILVA (Paulo Rogério Soares da Silva) já participou do quadro
societário da empresa executada. Alegou, ainda, a identidade do sobrenome de outros sócios da empresa PRS SILVA com os
sócios da empresa executada, inclusive o sobrenome “CLAUDINA”. Pois bem. No caso em tela, entendo que a sucessão
empresarial decorre do fato de formação de grupo econômico e desconsideração da personalidade jurídica, à luz do art. 50 do
Código Civil. Dispõe o art. 50, do Código Civil que: “Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de
finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe
couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens
particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica”. No caso em tela, restou caracterizado grupo econômico de fato
entre as empresas e configurado o abuso de personalidade jurídica, diante da confusão patrimonial. Os documentos de fls. 269,
270, 271 e 275/281 revelam que ao consultar o site da empresa executada (www.claudinacalcados.com.br), através de pesquisa
no goggle, extrai-se a informação de que o endereço da mesma situa-se na Rua Alfredo Leitão nº 106, cidade de Já/SP, com
CNPJ 01.750.896/0001-99, contudo, referido CNPJ pertence à empresa PRS SILVA CALÇADOS, a qual tem sede no endereço
mencionado, conforme se infere de seu contrato social (fls. 287/288). Em suma, através do site da empresa executada chega-se
ao CNPJ e endereço da empresa PRS SILVA CALÇADOS, o que demonstra que a confusão patrimonial, já que a referida
empresa utiliza o site da empresa executada para divulgar seus produtos. De outro giro, uma das sócias da empresa PRS SILVA
CALÇADOS (Luiza Claudina Bianco Soares), que se retirou da sociedade em 06/12/2007 (fls. 288), tem o mesmo sobrenome da
empresa executada “CLAUDINA”, sendo que em sua contestação a empresa mencionada não nega a existência de vínculos
familiares entre seus sócios Paulo Rogério Soares da Silva, Luiza Claudina Bianco Soares e Carla Bianco Soares da Silva e os
sócios da empresa executada, o que leva a conclusão da existência de um grupo econômico familiar de fato entre as duas
empresas. Ademais, o sócio da PRS SILVA CALÇADOS, Paulo Rogério Soares da Silva, já foi sócio da empresa executada, o
que reforça a tese de formação de grupo econômico familiar de fato entre as empresas. Destaque-se, ainda, que ambas que
ambas as empresas estão sediadas na Comarca de Jaú/SP e, embora os endereços não sejam idênticos, trata-se de locais
muito próximos (CEP: 17201-510 e CEP: 17200-000). De outro giro, nota-se que a empresa PRS SILVA CALÇADOS tem como
objeto social o comércio varejista de artigos vestuários e acessórios, enquanto que a empresa executada tem como objeto
social a fabricação de calçados de couro e comércio varejista de calçados. Em sua contestação, a empresa PRS SILVA
CALÇADOS alega que a empresa executada CLAUDINA INDÚSTRIA se dedica a produção e industrialização de calçados,
enquanto que a empresa PRS atua na representação e comercialização de calçados, ou seja, exclusivamente no ramo varejista,
contudo, o que se dessume é que as duas empresas atuam no ramo de calçados e, conforme se infere a fls. 309/314, a empresa
executada atua também no comércio varejista, mesmo ramo de atividade da empresa PRS. Trata-se, portanto, do mesmo ramo
de atuação, com objetos sociais afins, o que corrobora e reforça a tese da sucessão empresarial fraudulenta, com confusão
patrimonial, autorizando o reconhecimento da desconsideração da personalidade jurídica. Nesse contexto, considerando-se a
proximidade dos endereços das empresas, o fato de que os sócios das empresas pertencem ao mesmo grupo familiar e a
similitude das atividades, é possível concluir-se a conjugação de empresas familiares de um mesmo grupo econômico, operando
em sintonia ou em direcionamento coincidente, a caracterizar o abuso da personalidade jurídica, com confusão patrimonial.
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º