TJSP 13/06/2012 / Doc. / 2124 / Caderno 3 - Judicial - 1ª Instância - Capital / Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quarta-feira, 13 de Junho de 2012
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Capital
São Paulo, Ano V - Edição 1202
2124
Processo 0023002-92.2011.8.26.0008 - Procedimento Ordinário - Interpretação / Revisão de Contrato - Maria Mariana de
Andrade Lima - Banco Itaubba S.A - Vistos. MARIA MARIANA DE ANDRADE LIMA ajuizou a presente ação revisional de contrato
cumulada com consignação em pagamento, pelo rito ordinário, em face de BANCO ITAÚ BBA. S/A, pretendendo a revisão de
um contrato visando o financiamento do veículo Fiat/Siena, placas DDT 4793, e que seria composto por cláusulas abusivas,
primeiro no tocante aos juros exorbitantes, depois porque contados de forma capitalizada, em anatocismo que a legislação
proíbe, a gerar lucro exagerado, contemplativo de lesão, e também porque cobrados indevidamente multa e juros de mora, além
de comissão de permanência e outras tarifas para emissão de boletos e análise de crédito, tudo o que quer ver reconhecido e
alterado. Ao final, requer ainda a concessão de tutela antecipada visando a suspensão do pagamento das parcelas restantes ou
o depósito judicial no valor que entende devido ou ainda o depósito no valor integral, bem como a manutenção na posse do bem
e a exclusão de negativação de seu nome nos órgãos de proteção ao crédito. O pedido de tutela antecipada foi deferido
parcialmente, apenas para autorizar o depósito judicial das prestações vencidas e vincendas tal como pretendido, por conta e
risco da autora, sem suspensão dos efeitos da mora, bem como para impedir a isncrição do nome da autora nos órgãos de
proteção ao crédito. Citado, o réu apresentou contestação, oportunidade em que argüiu, preliminarmente, que o nome da autora
nunca foi inserido nos cadastros restritivos dos órgãos de proteção ao crédito, sendo ela litigante de má-fé. No mérito, pugnou
pela improcedência da ação, sustentando a inexistência de cláusulas contratuais nulas, bem como o cumprimento das
disposições do contrato, livremente assinado, e sem qualquer abusividade, inclusive quanto aos juros, não limitados a 12% ao
ano, defendendo-se a superação da discussão sobre a capitalização, mercê da edição da MP 2.170-36/01. Acrescentou cabível
a cobrança de comissão de permanência e dos demais encargos moratórios, bem como da tarifa de cobrança bancária e da
tarifa de abertura de crédito. Ao final, alegou estar a autora em mora. Registre-se réplica. É o relatório. F U N D A M E N T O E
D E C I D O. O feito comporta julgamento antecipado, na forma do artigo 330, inciso I do Código de Processo Civil, seja porque
a matéria é essencialmente de direito, seja porque as provas existentes nos autos são suficientes para o deslinde da questão
fática. Ademais, o Egrégio Supremo Tribunal Federal já de há muito se posicionou no sentido de que a necessidade de produção
de prova em audiência há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique em cerceamento de defesa. A
antecipação é legítima se os aspectos decisivos da causa estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do
magistrado (RTJ 115/789). De proêmio, deixo de designar audiência de tentativa de conciliação, conforme autoriza o artigo 331,
parágrafo 3º do Código de Processo Civil, já que o réu não manifestou interesse a tanto. Não havendo questões preliminares a
apreciar, uma vez que as matérias alegadas a este título pelo réu referem-se ao mérito, passo direito à análise deste e, neste
particular, a ação é improcedente. Senão vejamos. Sem embargo da relação entre as partes ser evidentemente de consumo e
estar subordinada aos preceitos gizados no Código de Defesa do Consumidor, o contrato celebrado entre as partes não padece
de qualquer iniquidade ou abusividade a ser contida. Assim, no que diz respeito particularmente à questão dos juros, que
poderiam ser considerados extorsivos e ilegais, porque não subordinados à limitação no percentual previsto constitucionalmente
no artigo 192, parágrafo 3o, tal discussão já está definitivamente superada, sobretudo após a edição da emenda constitucional
nº 40/03. Ademais, recentemente foi editada a Súmula 648, do seguinte teor: “A norma do § 3º do art. 192 da Constituição,
revogada pela Emenda Constitucional nº 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade
condicionada à edição de lei complementar”. Ainda que se analise a questão dos juros sob a ótica da Lei da Usura, também
neste particular não se vislumbra qualquer ilegalidade nas taxas praticadas pelo réu. Isso porque, as Instituições Financeiras
integram o Sistema Financeiro Nacional e, ao Conselho Monetário Nacional, através do Banco Central, delegou-se competência
para que sejam estabelecidas as taxas de juros bancárias, cabendo-lhes limitar, sempre que necessários, as mesmas (artigo 4o,
IX da Lei nº 4.595/64). Com base na Lei nº 4.595/64, entende-se que a cobrança de taxas excedentes às constantes no Decreto
nº 22.626/33 (Lei de Usura), desde que autorizadas pelo Banco Central do Brasil, não é ilegal (RTJ 79/620). A Súmula 596 do
Supremo Tribunal Federal consagrou este entendimento, in verbis: “As disposições do Dec. 22.626/33 não se aplicam às taxas
e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o Sistema
Financeiro Nacional.” Não se argumente, em contrapartida, sobre a submissão das Instituições Financeiras à Lei da Usura,
diante do disposto nos artigos 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e 48, inciso XIII, ambos da Constituição
Federal. Os dispositivos supra mencionados enfatizam que cabe ao Congresso Nacional legislar sobre matéria financeira,
cambial e monetária, instituições financeiras e suas operações, já não dispondo mais o Banco Central e o Conselho Monetário
Nacional das atribuições que lhes foram conferidas pela Lei da Reforma Bancária. Ocorre que tal disposição transitória não tem
efeito repristinatório, já que este somente se verifica expressamente, continuando, pois, as Instituições Financeiras livres da
limitação contida na Lei da Usura. Registre-se a jurisprudência: “Não há que se falar em repristinação do art. 1o do Dec.
22.626/33 em relação às instituições financeiras, mesmo em face do que dispõem os arts. 48, XIII da CF, e 25 do ADCT, pois tal
efeito, nos termos do art. 2o, parágrafo 3o da LICC, apenas ocorre expressamente. Assim, mesmo considerando não ser
atribuição do Conselho Monetário Nacional fixar o limite da taxa de juros, continuam as instituições financeiras livres da limitação
contida na Lei de Usura, enquanto não votada lei complementar ao art. 192 da CF.” (Ap. 753.199-3 8a Câm. - j. 25.11.1998, Rel.
Juiz José Araldo da Costa Telles - RT 768/230). Além disso, não é irracional antever que as taxas de juros, por exigência
dinâmica do mercado, não seriam incumbência propriamente legislativa do Congresso Nacional, cuja atuação, por natureza,
estaria cingida à edição de normas gerais, possibilitando margem de discricionariedade à condução da política econômica.
Deveras, a variação dos juros se insere como instrumento do governo na conjuntura do mercado e a recente reforma (EC 40/03)
reconheceu implicitamente o desacerto da postura populista que explicitou, na Assembléia Constituinte de 1988, o limite dos
juros. O dinheiro também se submete às leis do mercado (oferta e procura etc.). Se o crédito é escasso e a demanda por
financiamentos é grande, o custo do dinheiro aumenta; ao contrário, se a concessão de crédito é ampliada e o interesse no
empréstimo é menor, caem também os juros. Nessa dinâmica cabe ao Estado o papel regulador, com emissão de títulos públicos
para retirar o dinheiro de circulação, alteração de taxas de câmbio, leilões de ações, criando incentivos ou refreando determinadas
operações financeiras etc. Mera disposição jurídica era previsível como ineficaz para solução do complexo problema
macroeconômico. Nem mesmo aplicando-se os preceitos protetivos do Código de Defesa do Consumidor, já que este diploma
legal é de inequívoca aplicação aos contratos bancários, conforme já explicitado, é possível considerar abusiva ou ilegal a taxa
de juros praticada pelo réu, eis que aceita de livre e espontânea vontade pela parte autora, sem que sua vontade estivesse
eivada pelos vícios de consentimento, tampouco excessivamente onerosa diante da Teoria da Lesão. Registre-se que sobretudo
a inadimplência tem força substancial na elevação dos juros e os bons pagadores acabam suportando o aumento do índice de
risco. A questão é essencialmente governamental e somente em situação excepcional, de percentual de juros muito além da
média praticada no mercado, aqui não verificada, se admite a revisão das taxas. Só para enfatizar, a taxa de juros praticada
pelo réu na hipótese sub examine, além de não ser ilegal e inconstitucional, também não é excessivamente onerosa ao
consumidor em benefício do fornecedor do crédito a ponto de necessitar ser reduzida mediante intervenção judicial. A respeito,
como é sabido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, mesmo à luz do Código de Defesa do Consumidor e com socorro a
diversos precedentes, que “embora certa a incidência da legislação consumerista nos contratos bancários, a abusividade da
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º